CURA PELA MAGNETIZAÇÃO ESPIRITUAL
Sem dúvida os leitores se lembram do caso de uma cura quase
instantânea de um entorse, operada pelo Espírito do Dr. Demeure, poucos dias
após a sua morte e que relatamos na Revista de março último, como a descrição
da cena tocante ocorrida na ocasião. Esse excelente Espírito vem ainda
assinalar a sua boa vontade, por uma cura ainda mais maravilhosa, na mesma
pessoa.
Eis o que nos escrevem de Montauban, a 14 de julho último:
"O Espírito do Dr. Demeure acaba de dar-nos uma prova de
suta solicitude e de seu profundo saber. Eis em que ocasião. Na manhã de 26 de
maio último, a Sra. Maurel, nosso médium vidente e escrevente mecânico, deu uma
queda desastrosa e quebrou o ante-braço, um pouco abaixo do cotovelo. A fratura
complicada por distensões no punho e no cotovelo, estava bem caracterizada pela
crepitação dos ossos e inchação, que são os sinais mais certos.
Sob a impressão da primeira emoção produzida pelo acontecimento,
os pais da Sra. Maurel iam procurar o primeiro médico que aparecesse quando
esta, retendo-os, tomou de um lápis e escreveu mediunicamente, com a mão
esquerda: "Não procureis um médico; eu me encarrego disto. Demeure".
Então esperaram com confiança.
Conforme as indicações do Espírito, faixas e um aparelho foram
imediatamente confeccionados e colocados. Em seguida foi feita uma magnetização
espiritual praticada pelos bons Espíritos que, provisoriamente, ordenaram repouso.
Na noite do mesmo dia, alguns adeptos, convocados pelos
Espíritos, reuniram-se em casa da Sra. Maurel que, adormecida por um médium
magnetizador, não demorou a entrar em sonambulismo. Então o Dr. Demeure
continuou o tratamento que havia iniciado pela manhã, agindo mecanicamente
sobre o braço fraturado, já sem outro recurso aparente além de sua mão
esquerda, nossa doente tinha tirado rápido o primeiro aparelho, deixando apenas
as faixas, quando se viu insensivelmente e sob a influência da atração magnética,
o membro tomar diversas posições, próprias para facilitar a redução da fratura.
Parecia, então ser objeta de toques inteligentes, sobretudo no ponto onde devia
operar-se a soldadura dos ossos; depois se alongava, sob a ação de trações
longitudinais.
Após alguns instantes dessa magnetização espiritual, a Sra.
Maurel procedeu sozinha, à consolidação das faixas e a uma nova aplicação do
aparelho, consistente de duas tabuinhas ligadas entre si e ao braço por meio de
uma correia. Tudo, pois, se havia passado como se um hábil cirurgião tivesse,
ele próprio, operado visivelmente. E, coisa curiosa, ouvia-se durante o
trabalho as palavras que, em suador, se escapavam da boca da paciente:
"Não aperte tanto!... Vós me maltratais!... ". Ela via o Espírito do
doutor é era a ele que se dirigia, suplicando poupar sua sensibilidade. Era,
pois, um ser invisível para todos, exceto para ela, que lhe fazia apertar o
braço, servindo-se inconscientemente de sua própria mão esquerda.
Qual o papel do médium magnetizador durante esse trabalho? Aos
nossos olhos parecia inativo; com a mão direita apoiada na espádua da
sonâmbula, contribuía com sua parte para o fenômeno, pela emissão de fluidos
necessários à sua realização.
Na noite de 27 para 28, tendo a Sra. Maurel desarranjado o
braço, em conseqüência de uma posição falsa, tomada durante o sono, declarou-se
uma febre alta, pela primeira vez. Era urgente remediar esse estado de coisas.
Assim reuniram-se novamente no dia 28 e, uma vez declarado o sonambulismo foi
formada a cadeia magnética, a pedido dos bons Espíritos. Após diversos passes e
manipulações, em tudo como as acima descritas, o braço foi recolocado em bom
estado, não sem ter a pobre senhora experimentado dores muito cruéis. Apesar do
novo incidente, o membro já se ressentia do efeito salutar produzido pelas
magnetizações anteriores.
O que se segue alias o prova. Momentaneamente desembaraçado das
tabuinhas, repousava sobre almofadas, quando de repente se levantou alguns
centímetros em posição horizontal e dirigido suavemente para a esquerda e para
a direita; depois baixou obliquamente e foi submetido a uma nova tração. A
seguir os Espíritos se puseram a girá-lo e tornar a girá-lo em todos os
sentidos e de vez em quando, fazendo trabalhar direito as articulações do
cotovelo e do punho. Tais movimentos automáticos imprimidos a um braço
fraturado inerte, contrários a todas as leis conhecidas da gravidade e da
mecânica, só podiam ser atribuídos à ação fluídica. Se não tivesse havido a
certeza da existência dessa fratura, bem como os gritos dilacerantes dessa
pobre senhora, confesso que teria tido muita dificuldade em admitir o fato, um
dos mais curiosos que a ciência possa registrar. Assim, posso dizer, com toda a
sinceridade, que me sinto feliz por ter testemunhado semelhante fenômeno.
Nos dias 29, 30, 31 e seguintes as magnetizações espirituais
sucessivas, acompanhadas de manipulações variadas de mil maneiras trouxeram sua
sensível melhora no estado geral de nossa doente. Diariamente o braço adquiria
novas forças. Sobretudo o dia 31 deve ser assinalado, como marcando o primeiro
passo para a convalescença. Naquela noite dois Espíritos, que se faziam notar
pelo brilho de sua radiação, assistiam ao nosso amigo Demeure. Pareciam dar-lhe
conselhos, que este se apressava em por em prática. Um deles, até, de vez em
quando se punha à obra e, por sua suave influência; produzia sempre um alívio
instantâneo. Pelo fim da noite as tabuinhas foram definitivamente abandonadas e
ficaram só as faixas, para sustentar o braço e mantê-lo em determinada
posições.
Devo acrescentar que, além disso, um aparelho de suspensão vinha
aumentar a solidez do enfaixamento. Assim, no sexto dia após o acidente e, mau
grado a recaída sobrevinda a 27, a fratura estava em tal via de cura, que o
emprego dos meios usados pelos médicos durante trinta ou quarenta dias, tinha
se tornado inútil. A 4 de junho, dia fixado pelos bons Espíritos para a redução
da fratura complicada de distensões, reunimo-nos à noite. A Sra. Maurel, apenas
em sonambulismo, pôs-se a desenrolar as faixas, ainda enroladas no braço,
imprimindo-lhe um movimento de rotação tão rápido que dificilmente o olho
seguia os contornos da curva descrita. A partir desse momento, servira-se do
braço como habitualmente. Estava curada.
No fim da sessão houve uma cena tocante, que merece ser
relatada. Os bons Espíritos, em número de trinta, no começo formavam urna
cadeia magnética, paralela à que nós próprios formávamos. Tendo-se levantado, a
Sra. Maurel, pela mão direita, punha-se em comunicação direta, sucessivamente,
com cada dois Espíritos, colocada no interior das duas cadeias, recebia a ação
benéfica da dupla corrente fluídica enérgica. Radiosa de satisfação,
aproveitava a ocasião para agradecer com efusão o poderoso concurso que tinham
prestado 1a sua cura. Por sua vez, recebia encorajamento a perseverar no bem.
Terminado isto, ela experimentou suas forças de mil modos; apresentando o braço
aos assistentes, fazia-os tocar nas cicatrizes da soldadura dos ossos;
apertava-lhes a mão com força, indicando com alegria a cura operada pelos bons
Espíritos. Ao despertar, vendo-se livre em todos os movimentos, desfaleceu,
dominada por profunda emoção!..."
Quando se foi testemunha de tais fatos não se pode deixar de os
proclamar alto e bom som, pois merecem atrair a atenção da gente séria.
Porque, então no mundo inteligente se encontra tanta resistência
em admitir a influência do Espírito sobre a matéria? Porque se encontram
pessoas que crêem na existência e na individualidade do Espírito, mas lhes
recusam a possibilidade de se manifestar? É porque não se dão conta das
faculdades físicas do Espírito, que se lhes afigura imaterial de maneira
absoluta.
Ao contrário, a experiência demonstra que, por sua própria
natureza, ele age diretamente sobre os fluidos imponderáveis e, por
consequinte, sobre os fluidos ponderáveis, e mesmo sobre os corpos tangíveis.
Como procede um magnetizador ordinário? Suponhamos que queira
agir, por exemplo, sobre um braço. Concentra sua atenção sobre esse membro e,
por um simples movimento dos dedos, executado à distância e em todos os
sentidos, agindo absolutamente como se o contato da mão fosse real, dirige uma
corrente fluídica sobre o ponto desejado. O Espírito não age diversamente. Sua
ação fluídica se transmite de perispírito a perispírito, e deste ao corpo material.
O estado de sonambulismo facilita consideravelmente essa ação graças ao
desprendimento do perispírito, que melhor se identifica com a natureza fluídica
do Espírito, e sofre, então, a influência magnética espiritual, elevada ao seu
maior poder.
Toda a cidade ocupou-se desta cura, obtida sem auxílio da
ciência oficial, e cada um dá o seu palpite. Uns pretenderam que o braço não se
tinha quebrado; mas a fratura tinha sido bem e devidamente constatada por
numerosas testemunhas oculares, entre outras o Dr. D., visitou a doente durante
o tratamento. Outros disseram: "E muito surpreendente!" e pararam
nisto.
Inútil acrescentar que alguns afirmavam que a Sra. Maurel tinha
sido curada pelo diabo. Se ela não estiverem entre mãos profanas, nisso teriam
visto um milagre. Para os espíritas, que se dão conta do fenômeno, aí vêem
muito simplesmente a ação de uma força natural, até agora desconhecida, e que o
Espiritismo veio revelar aos homens.
Observações: Se há fatos espíritas que, até certo ponto,
poderiam ser atribuídos à imaginação, como, por exemplo, os das visões, neste
já não seria o mesmo. A Sra. Maurel não sonhou que tivesse quebrado o braço,
como não sonharam diversas pessoas que acompanharam o tratamento; as dores que
sentia não eram alucinação; sua cura em oito dias não é uma ilusão, pois se
serve de seu braço, o fato que no estado atual dos conhecimentos, parece
impossível. Mas não foi assim sempre que se revelaram novas leis? É a rapidez
da cura que vos espanta? Mas não terá a medicina descoberto inúmeros agentes
mais ativos do que os que conhecia para apressar certas curas? Nos últimos
tempos não foram achados meios de cicatrizar certas feridas quase que
instantaneamente? Não se encontrou o de ativar a vegetação e a frutificação?
Porque não se poderia ter um para ativar a soldagem dos ossos? Então conheceis
todos os agentes da natureza? Deus não tem mais segredos para vós? Não há mais
lógica em negar hoje a possibilidade de uma cura rápida do que havia, no século
passado, de negar a possibilidade de fazer nalgumas horas o caminho que se
levaram dez dias para percorrer. Direis que este meio não está no codex; é
verdade; mas antes que a vacina nele fosse inscrita, seu inventor não foi
tratado como louco? Os remédios homeopáticos também lá não se acham, o que não
impede que os médicos homeopatas se encontrem em toda a parte e curem. Aliás,
como aqui não se trata de uma preparação farmacêutica, é mais provável que esse
meio de cura não figure por muito tempo na ciência oficial.
Dirão, porém, se os médicos vem exercer sua arte depois de
mortos, querem fazer concorrência aos médicos vivos; é bem possível;
entretanto, que estes últimos se garantam; s eles lhes arrancam algumas
praticas, não é para os suplantar, mas para lhes provar que não estão
absolutamente mortos, e lhes oferecer o concurso desinteressado aos que
quiserem aceitá-lo. Para melhor faze-los compreender, mostram-lhes que, em
certas circunstâncias, pode-se passar sem eles. Sempre houve médicos e os
haverá sempre; apenas os que aproveitarem as novidades que lhes trouxerem os
desencarnados terão uma grande vantagem sobre os que ficarem para trás. Os
Espíritos vem ajudar o desenvolvimento da ciência humana, e não suprimi-la.
Na cura da Sra. Maurel, um fato que surpreenderá, talvez, ainda
mais que a rápida soldura dos ossos, é o movimento do braço fraturado, que
parece contrário a todas as leis conhecidas da dinâmica e da gravidade.
Contrário ou não, o fato aí está; desde que existe, tem uma causa; desde que se
renova, está submetido a uma lei. Ora, essa lei que o Espiritismo nos vem dar a
conhecer pelas propriedades dos fluidos perispiritais. Aquele braço que,
submetido só às leis da gravidade, não podia erguer-se, suponde-o mergulhado
num líquido de uma densidade muito maior que a do ar, fraturado como está, uma
vez sustido por esse liquido que lhe diminui o peso, poderá aí mover-se sem
esforço, e até erguido som o menos esforço. É assim que num banho, o braço que
parece muito pesado fora da água, parece muito leve dentro da água. Substitui o
liquido por um fluido que goze das mesmas propriedades e tereis o que se passa
no caso presente, fenômeno que repousa no mesmo princípio que o das mesas e das
pessoas que se mantém no espaço sem ponto de apoio. Esse fluido é o fluido
perispirital, que o Espírito dirige à vontade, e cujas propriedades modifica
pela simples ação da vontade. Na circunst6ancia presente, deve-se, pois,
imaginar o braço da Sra. Maurel mergulhado num meio fluido que produz o efeito
do ar sobre os balões.
Alguém perguntava, a respeito, se na cura dessa fratura, o
Espírito do Dr. Demeure teria agido com ou sem concurso da eletricidade e do
calor. A isto respondemos que a cura foi produzida, no caso, como em todos os
casos de cura pela magnetização espiritual, pela ação do fluido emanado do
Espírito; que esse fluido, posto que etéreo, não deixa de ser matéria; que pela
corrente que lhe imprime, o Espírito pode com ele impregnar e saturar todas as
moléculas da parte doente; que pode modificar suas propriedade, como o
magnetizador modifica as da água, dando-lhe uma virtude curativa às
necessidades; que a energia da corrente está na razão do número, da qualidade e
da homogeneidade dos elementos que constituem a corrente das pessoas chamadas a
fornecer seu contingente fluídico. Essa corrente provavelmente ativa a secreção
que deve produzir a soldadura dos ossos e assim produz a cura mais rápida do
que quando entregue a si mesma.
Agora a eletricidade e o calor representam um papel no fenômeno?
Isto é tanto mais provável quanto o Espírito não curou por milagre, mas por uma
aplicação mais judiciosa das leis da natureza, em razão de sua clarividência.
Se, como a ciência, é levada a admitir, a eletricidade e o calor não são
fluidos especiais, mas modificações ou propriedades de um fluido elementar
universal, devem fazer parte dos elementos constitutivos do fluido perispiritual.
Sua ação, no caso vertente, está implicitamente compreendida, absolutamente
como quando se bebe vinho, necessariamente se bebe água e álcool.
Revista Espírita, setembro de 1865
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