quinta-feira, 25 de outubro de 2012


AS MARCAS DO CRISTO

"E eu, irmãos, apliquei estas coisas, por semelhança a mim e a Apolo, por amor de vós, para que em nós aprendais a não ir além do que está escrito, não vos ensoberbecendo a favor de um contra outro.
"Porque quem é que te faz sobressair? E que tens tu que não tenhas recebido? E se o recebeste, por que te glorias, como se não o houvera recebido?
"Já estais fartos! Já estais ricos! Sem nós reinais! E oxalá reinásseis para que também nós reinemos convosco!
"Porque tenho para mim que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos, como condenados à morte; pois somos feitos espetáculos ao mundo, aos anjos e aos homens.
"Nós somos loucos por amor de Cristo e vós sábios em Cristo; nós fracos e vós fortes; vós ilustres e nós vis.
"Até a presente data sofremos fome e sede, e estamos nus, e recebemos bofetadas, e não temos pousada certa.
"E nos afadigamos, trabalhando com nossas próprias mãos; somos injuriados e bendizemos; somos perseguidos, e suportamos;
"Somos blasfemados e rogamos; até ao presente temos chegado a ser como o lixo deste mundo, e como a escória de todos" - (I Coríntios, Capítulo 4, versículos 6 a 13).

O preconceito existente no meio espírita em relação aos textos das Escrituras faz com que se deixe de lado sua leitura e exame, perdendo a oportunidade de aprender com as lições desses grandes mestres do passado. O manancial de aprendizado deixado nas cartas do apóstolo Paulo, por exemplo, são uma fonte inesgotável de sabedoria, onde se pode buscar valorosas instruções, inspirações e ânimo para o desenvolvimento das tarefas assumidas como trabalhadores do Senhor. No entanto, dizem os detratores das Escrituras que não passam de ensinos judaicos e que Paulo era um legítimo representante deles. Tratam a cultura judaico-cristã como se fosse um legado de erros e vergonha. Respeitamos suas opiniões, mas seguiremos buscando aprender com esse servo de Deus, que sem dúvida, é o maior nome da história do Cristianismo, depois de Jesus.
Com o objetivo de orientar os muitos núcleos fundados, Paulo enviava cartas aos seus discípulos, devido às grandes distâncias que o impossibilitava de estar com eles como gostaria. Nesses escritos, procurava mostrar sempre qual o papel de um trabalhador da Seara do Cristo, quando está imbuído da responsabilidade conferida ao seu ministério. Pode-se imaginar a dificuldades que teve esse homem de instruir naquele tempo onde a ignorância das coisas espirituais era bem mais abundante do que hoje, se no meio espírita, ainda se tem grande impecilho ao entendimento.
No texto acima, ele faz uma severa reprovação aos irmãos do grupo de Corinto, que já achavam-se doutos o suficiente para ensinar, vangloriando-se do seu saber, ensoberbecidos pelas glórias do mundo. O núcleo em questão tinha problemas resultantes das dissensões existentes entre os trabalhadores, da imoralidade reinante que se infiltrava entre eles e principalmente pelas idéias dos que já se achavam auto-suficientes para prescindir da orientação do Apóstolo, e ensinavam segundo suas próprias doutrinas. A soberba, como hoje, embotava a compreensão do essencial.
Paulo procura mostrar nesse belo escrito, a insuficiência e limitação do trabalhador, que nada pode por ele mesmo, sem a bondade e misericórdia do Mestre. Ele é quem confere à criatura a condição necessária para desempenhar determinada tarefa. É por Sua benevolência que dá a oportunidade de trabalhar em Sua seara e não se pode considerar que se é especial por estar com esta ou aquela responsabilidade dentro do grupo. Tomos somos seres ainda necessitados de amparo e corrigendas.
"E que tens tu que não tenhas recebido? E se o recebeste, por que te vanglorias, como se não tiveras recebido?", diz Paulo, nesta dura reprimenda aos orgulhosos e soberbos. Mais uma vez a ignorância que faz tolos, surdos e cegos. O descabido orgulho que não permite a compreensão de coisas tão óbvias, como a necessidade urgente de reflexão e melhorias. Problemas graves encontrados na intimidade de muitos e que deverão ser rapidamente identificados e tratados, se se quiser realizar alguma coisa no campo do Bem.
Junto a isso, tem a explícita vaidade que arrasta os incautos aos palcos dos aplausos fáceis, afastando-os da condição de humildes servos, pois não trazem no corpo as marcas do Cristo. Essas marcas são de sacrifícios e renúncias, e não de glórias mundanas; são de humildade e não de exaltação; de sinceridade e não de hipocrisia, lisonja e soberba; são de abnegação, coragem, altruísmo e perseverança. Somos os trabalhadores do Senhor de que fala Allan Kardec, no Evangelho Segundo o Espiritismo? Examine-se a consciência e procure-se identificar essas marcas em cada um. Certamente ter-se-á dificuldades em encontrá-las.
Os trabalhadores da seara espírita geralmente julgam-se detentores de muitas luzes. Comportam-se como se escolhidos fossem para desempenhar sublime missão e, considerando-se seres especiais, preocupam-se muito pouco com seu aprimoramento, o que leva muitos a trilhar por caminhos tais que, no mais das vezes, nada de edificante produzem, tornando-se estéreis como a figueira seca. Acostumam-se com os aplausos e alimentam-se disso sem se darem conta da dívida que assumem com o Alto.
A Doutrina Espírita, sendo o Consolador prometido por Jesus, trouxe de volta as lições do Mestre, a simplicidade dos núcleos, onde a mensagem divina era ensinada pela inspiração dos Espíritos do Bem. As casas espíritas necessitam reencontrar esse caminho. São elas, através de trabalho sério, que poderão despertar as criaturas ao conhecimento da verdade. Enquanto se estiver discutindo o sexo dos anjos nas casas espíritas e deixando de lado o essencial, nada de edificante se produzirá para o Espírito imortal.
O trabalhador espírita, verdadeiramente compenetrado do seu dever, deverá zelar pela seriedade da tarefa, entendendo que Jesus só precisa de homens de bem para empreender a transformação do planeta. O trabalho é simples, embora grave. Entretanto, enquanto se permanecer na fantasia de que os espíritas são especiais porque detém a sabedoria, enquanto os trabalhadores enfeitarem-se com virtudes que não possuem, infelizmente se estará caminhando na contramão do progresso do Espírito. E certamente necessitando da mesma reprovação que Paulo fez aos coríntios há dois mil anos.

Texto publicado no site em 29/10/99
Vanda Simões

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