quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

CIÚMES E CONTENDAS

"Eu, porém, irmãos, não vos pude falar como a espirituais e sim como a carnais, como crianças em Cristo. Leite vos dei de beber, não vos dei alimento sólido, porque não poderíeis suportá-lo. Nem ainda agora podeis, porque sois carnais. Porquanto, havendo entre vós ciúmes e contendas, não é assim que sois carnais e andais segundo o homem? Quando, pois alguém diz: Eu sou de Paulo, e outro: Eu sou de Apolo, não é evidente que andais segundo os homens? Quem é Apolo? E quem é Paulo? Servos por meio de quem crestes, e isto conforme o Senhor concedeu a cada um. Eu plantei, Apolo regou, mas o crescimento veio de Deus. De modo nenhum quem planta é alguma coisa, nem quem o rega, mas Deus, que dá o crescimento. Ora, o que planta e o que rega são um; e cada um receberá o seu galardão, segundo o seu próprio trabalho. Porque de Deus somos cooperadores; lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós" - (I Coríntios, Capítulo 3, versículos 1 a 9).
Quantos problemas poderiam ser evitados dentro do Movimento Espírita em geral e dentro de nós mesmos em particular, se tivéssemos o hábito de beber nos ensinamentos dos grandes mestres do passado. Os escritos do apóstolo Paulo trazem grande sabedoria e merecem horas de reflexão por parte de quem quer iluminar-se. Vêm impregnados por uma força incomum, impulsionando os que se deixam envolver com sinceridade pela mensagem de Jesus, aos caminhos de renovação do ser.
No texto acima, Paulo faz grave advertência aos discípulos de Corinto. Apolo, grande pela sua eloquência com a palavra, arrastava muitos admiradores e adeptos para a nova crença. Logo encontrou quem o endeusasse e disseminasse que era maior que Paulo, estabelecendo um clima de ciúme, disputa e discórdia no grupo. O Apóstolo, entendendo o perigo da idolatria, pois estava no meio de pagãos, tratou de esclarecer aos integrantes do núcleo, de onde vinha o alimento que proporciona o crescimento, colocando os dois como simples servos de Deus, dando uma lição espetacular de humildade diante do poder do Criador sobre todos os homens.
Trata-os como crianças em entendimento, já que se apegavam a coisas tão tolas como os mesquinhos sentimentos de disputa, frutos da vaidade e orgulho, comuns na sociedade humana. Não teriam condições, portanto, de entender a plenitude da mensagem de Jesus, pois ainda encontravam-se presos aos valores perecíveis da matéria. Faz uma distinção importante entre a doutrina dos homens e a doutrina do Mestre, mostrando o enorme abismo existente entre elas. "Falo como a carnais e não como a espirituais, pois andais segundo os homens", diz ele, afinal, a escola dos homens é fundamentada na luta pelo ter, pelo poder temporal, pelos primeiros lugares na festa, originando ciúmes e contendas, escravizando o homem, anulando o ser espiritual que ele desconhece. O alimento sólido de que fala, diz respeito às coisas espirituais, tratadas com desdém pelos que não compreendem e que têm como prioridade os valores fugazes e temporários da conquista terrena.
A missão de Paulo era árdua, pois além de semear a mensagem em um ambiente inóspito, lutava para que permanecesse livre das influências do judaísmo e paganismo reinantes. Conhecedor das dificuldades naturais do ser humano em estabelecer mudanças em sua vida, ficava atento para as muitas inserções que comumente encontrava em núcleos onde tinha fundado, baseado unicamente na doutrina de Jesus. A idolatria era um grande problema e ele não se cansava de mostrar-se como um servo falível, embora trabalhando incessantemente para imitar o Modelo Maior. No episódio descrito, deixa claro aos seus discípulos a cegueira espiritual existente na idolatria de vivos, perfeitamente justificada pela ignorância dos homens daquela época.
Como foi dito antes, evitar-se-iam muitas coisas desagradáveis se tivéssemos o cuidado de estudar os ensinos dos grandes mestres. Atualmente, vive-se situação semelhante a essa de séculos atrás. A disputa sutil entre os que querem ser maiores em entendimento é visível e isso só demonstra que ainda se anda segundo os homens. Diz Paulo: "nem quem planta, nem quem rega é coisa alguma, mas Deus que dá o crescimento". Não importa, portanto, de onde venha o ensino, desde que ele tenha os fundamentos básicos da doutrina do Mestre e esteja sendo útil para esclarecer o homem, retirando-o do mundo de ilusões em que se encontra.
A vaidade reinante entre os que se acham eleitos de Deus e o fanatismo existentes geraram em nosso meio um clima de idolatria semelhante àquele do passado, onde os adeptos diziam ser Apolo maior que Paulo e se dividiam conforme as preferências de cada um. Uns diziam-se de Apolo, outros de Paulo. Outrora, a ilusão causada pela ignorância. Hoje, a ilusão detonada pela insensata vaidade.
A falta da humildade, virtude exemplificada na atitude enérgica de Paulo, faz com que idólatras e idolatrados não se dêem conta disso e sigam seus caminhos ensinando segundo os homens e não segundo Cristo, embora considerem-se seus dignos representantes. É tempo de se compreender o óbvio. O discurso não pode ter a intenção de angariar a admiração de quem ouve, mas a força viva da exemplificação, sem a qual será tido como palavra vã e estéril filosofia.
Os que semeiam os ensinamentos de Jesus só terão êxito em suas plantações se houver o alimento necessário ao crescimento. Este é dado por Deus aos que demonstram sinceridade de propósitos e, acima de tudo, a humildade necessária para reconhecer qual o lugar que lhes compete neste inesgotável campo de trabalho. Todos são dignos de confiança, desde que não disseminem doutrinas contrárias ao crescimento do ser e cuide dos interesses imperecíveis do Espírito. Os frutos de cada trabalho poderão demonstrar se os trabalhadores estão aptos a receber o alimento sólido de que fala o incansável Apóstolo.

Autor: Vanda Simões
Texto publicado no site em 06/08/99

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